O regresso das barracas, um sinal do país que está de volta ao passado

Published Mar 18, 2025, 1:20 AM

Os mais velhos ainda se lembram das enormes manchas de telhados de zinco, das paredes sem reboco, das ruas enlameadas de tantos bairros das grandes cidades do Portugal dos anos de 1980. Lembram-se ainda de que no Portugal europeu, no princípio da década seguinte, o país lançou o Plano Especial de Realojamento que, no espaço de 15 anos, pôs termo às bolsas de barracas em 28 municípios do país, entregando casas dignas a 48 418 famílias até 2019.

Para quem tem presente o fio do tempo da habitação, só pode encarar a demolição de barracas ilegais em Loures ou em outras cidades populosas como um regresso a um passado de má memória. Sabemos a cor do pano de fundo deste testemunho que nos faz pensar na pobreza, na exclusão, nos bidonvilles da emigração portuguesa de há 60 anos ou das favelas. O preço da habitação ou das rendas é inacessível para muitos. Em especial para comunidades de imigrantes pouco qualificados que vivem do salário mínimo ou nem isso. O PER parou há anos e criou-se um vazio na oferta pública de habitação e a alternativa é a construção de barracas sem o mínimo de condições para se viver.

O Estado responde com o famoso Plano de Recuperação e Resiliência, que prevê um investimento de 1400 milhões de euros para dar oportunidade a 26 mil famílias de terem casa até 2026. Para lá de dispor de mecanismos de apoio para famílias em situação de emergência e de construir mais 6000 casas a custos acessíveis a partir do património do Estado.

Até que estes investimentos possam mitigar o problema, porém, sobra uma dúvida: o que fazer com as famílias que hoje vivem em barracas ilegais? Por todas as razões legais e de segurança, os poderes públicos não podem cruzar os braços. Mas por razões éticas, não devem expulsar famílias sem lhes oferecer alternativas. É nesta frente que se situa a luta do Movimento Vida Justa, a plataforma que, na sua própria definição, “dá voz aos bairros” e às populações mais carenciadas, em especial da grande Lisboa.

Para este episódio, o P24 convidou Flávio Almada, o porta-voz do Movimento que tem organizado acções de protesto contra a falta de habitação ou contra os despejos. Flávio Almada é um rapper conhecido como LBC, porta-voz do Movimento Vida Justa, coordena o Moinho da Juventude, na Cova da Moura, na Amadora, uma das maiores e mais antigas associações daquele bairro, que providencia educação e alimentação a crianças. É um activista com um mestrado em Estudos Internacionais, que integra várias plataformas e colectivos de acção cultural e integração social.