André Ventura não escondeu o alcance profundo da sua proposta de lei que, entre outras medidas, visa proibir o uso de burcas em Portugal. Começou por dizer que quem vem de fora tem de se sujeitar às regras de Portugal – isto dando de barato que existe uma regra em Portugal que obriga as mulheres a andar de rosto destapado. E acrescentou que as mulheres que usam burqa deixaram de ser pessoas livres e passaram a ser vítimas dos homens ou de uma cultura que os oprime. Passo a passo, as maiorias geradas na Assembleia da República vão testando as fronteiras dos direitos, liberdades e garantias Constituição - a lei do Chega, recorde-se, votada pelo CDS, IL e PSD, mereceu pareceres negativos do Conselho Superior do Ministério Público, da Ordem dos Advogados e da Associação Portuguesa de Mulheres Juristas. Por arrastamento, Portugal vai criando cada vez mais superfícies de atrito entre nativos e estrangeiros. “Isto aqui não é o Bangladesh, dizia em pleno parlamento uma deputada do Chega”.

A proibição das burcas e do niqab não é uma originalidade. A França adoptou essa proibição em 2010 e desde então vários países europeus seguiram o mesmo caminho sem que, em todos os casos, a força motriz da proibição seja a extrema-direita. Há questões associadas à laicidade, à segurança e até à igualdade das mulheres que orientam em muitos casos as decisões das democracias. O Tribunal de Justiça da UE e o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, insuspeito de ser um fórum conservador, consideraram legais essas decisões de proibir a cobertura do rosto das mulheres.

Não sendo uma prescrição do Corão, logo um símbolo da religião, a burca tornou-se no ocidente o símbolo de uma cultura opressiva que conflitua com os valores da abertura social, da liberdade ou da igualdade de género. Na oposição, a intolerância para com os muçulmanos aumentou – lembram-se de Boris Johnson comparar as mulheres com burca a caixas de correio? No nosso caso, a nova lei significa o quê? Um expediente para legitimar medidas restritivas contra a imigração? Um pretexto para dar sentido ao clima securitário que anda no ar? Uma exigência em defesa das mulheres?

Temos hoje connosco para falar destes temas o professor assistente convidado da Universidade Portucalense Daniel Gomes, especialista em justiça constitucional e direitos humanos fundamentais, que está a desenvolver uma investigação de doutoramento centrada no princípio da igualdade e da não discriminação.

Andr&eacute; Ventura n&atilde;o escondeu o alcance profundo da sua proposta de lei que, entre outras medidas, visa proibir o uso de burcas em Portugal. Come&ccedil;ou por dizer que quem vem de fora tem de se sujeitar &agrave;s regras de Portugal &ndash; isto dando de barato que existe uma regra em Portugal que obriga as mulheres a andar de rosto destapado. E acrescentou que as mulheres que usam&nbsp;burqa&nbsp;deixaram de ser pessoas livres e passaram a ser v&iacute;timas dos homens ou de uma cultura que os oprime. Passo a passo, as maiorias geradas na Assembleia da Rep&uacute;blica v&atilde;o testando as fronteiras dos direitos, liberdades e garantias Constitui&ccedil;&atilde;o - a lei do Chega, recorde-se, votada pelo CDS,&nbsp;IL&nbsp;e PSD, mereceu pareceres negativos do Conselho Superior do Minist&eacute;rio P&uacute;blico, da Ordem dos Advogados e da Associa&ccedil;&atilde;o Portuguesa de Mulheres Juristas. Por arrastamento, Portugal vai criando cada vez mais superf&iacute;cies de atrito entre nativos e estrangeiros. &ldquo;Isto aqui n&atilde;o &eacute; o&nbsp;Bangladesh, dizia em pleno parlamento uma deputada do Chega&rdquo;.
A proibi&ccedil;&atilde;o das burcas e do&nbsp;niqab&nbsp;n&atilde;o &eacute; uma originalidade. A Fran&ccedil;a adoptou essa proibi&ccedil;&atilde;o em 2010 e desde ent&atilde;o v&aacute;rios pa&iacute;ses europeus seguiram o mesmo caminho sem que, em todos os casos, a for&ccedil;a motriz da proibi&ccedil;&atilde;o seja a&nbsp;extrema-direita. H&aacute; quest&otilde;es associadas &agrave; laicidade, &agrave; seguran&ccedil;a e at&eacute; &agrave; igualdade das mulheres que orientam em muitos casos as decis&otilde;es das democracias. O Tribunal de Justi&ccedil;a da UE e o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, insuspeito de ser um f&oacute;rum conservador, consideraram legais essas decis&otilde;es de proibir a cobertura do rosto das mulheres.
N&atilde;o sendo uma prescri&ccedil;&atilde;o do Cor&atilde;o, logo um s&iacute;mbolo da religi&atilde;o, a burca tornou-se no ocidente o s&iacute;mbolo de uma cultura opressiva que conflitua com os valores da abertura social, da liberdade ou da igualdade de g&eacute;nero. Na oposi&ccedil;&atilde;o, a intoler&acirc;ncia para com os mu&ccedil;ulmanos&nbsp;aumentou &ndash;&nbsp;lembram-se de Boris Johnson comparar as mulheres com burca a caixas de correio? No nosso caso, a nova lei significa o qu&ecirc;? Um expediente para legitimar medidas restritivas contra a imigra&ccedil;&atilde;o? Um pretexto para dar sentido&nbsp;ao clima&nbsp;securit&aacute;rio que anda no ar? Uma exig&ecirc;ncia em defesa das mulheres?
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